Quente! Sufocante! Infernal! Esses são os adjetivos mais fiéis que encontrei para descrever essa estação do ano no Japão. De junho a setembro, o 夏 (natsu = verão) faz a terra do sol nascente ferver, derreter, entrar em estado de ebulição. Com temperaturas sempre acima dos 23°C, esse calorzão nos faz transpirar, pingar, perder boas noites de sono rolando em uma poça de suor no 布団 (futon = colchão em que os japoneses dormem, geralmente colocado diretamente no chão), gastar centenas de 円 (en = ienes = moeda do Japão) em conta de luz com o ar-condicionado no final do mês. Mas não para por aí: 虫 (mushi = insetos) de todos os tipos se materializam em todos os lugares. É a época da sinfonia das セミ (semi = cigarras), das teias de クモ (kumo = aranhas), das ゴキブリ (gokiburi = baratas) cascudas, dos bichos que nem imagino os nomes. É ruim para trabalhar, para ficar à toa, pensar, comer, dormir, acordar, realizar qualquer movimento. O corpo amolece, a cabeça não consegue raciocinar, a pele gruda em todas as superfícies, o rosto fica brilhante e as roupas mal cheirosas. 日本の夏は地獄です!(Nihon no natsu wa jigoku desu = o verão japonês é um inferno!)
Esse é o nosso primeiro verão no arquipélago e a experiência não poderia estar sendo pior. No Brasil, um país tropical, faz calor quase o ano inteiro, mas engana-se quem pensa que por conta disso tiraríamos de letra o verão japonês. Calor igual, só sentimos em Ilhéus, na Bahia, em nossa lua de mel. O nordeste brasileiro, sim, deve ser tão quente quanto aqui. O verão paulista é mais fresco, arejado, dá para superá-lo com um bom ventilador e todas as janelas de casa escancaradas. Do outro lado do mundo, é abafado, parece um forno, uma sauna, impossível de sobreviver com o ar-condicionado desligado e sem um ventilador de reserva. Aqui em 磐田 (Iwata), durante o dia tem feito 28°C, e à noite, 23°C. Mas dizem que em agosto chegará a 35°C! Ahhh, se estivéssemos em 沖縄 (Okinawa)...
沖縄, para quem não conhece, é a província mais ao sul do país. Ela era propriedade dos Estados Unidos até 1975, quando foi devolvida ao 日本 (Nihon = Japão). Eu diria que 沖縄 é o ブラジル (Burajiru = Brasil) no 日本: clima tropical, cultivo de banana, pessoas bronzeadas e praias paradisíacas. Só faltam a pelada, o samba e a caipirinha para ser o Brasil. O Japão possui muitas praias, no entanto, a maioria é artificial, ou seja, pegam um rio qualquer e enchem a costa de areia e chamam aquilo de praia. Devem achar a coisa mais linda do mundo, pois fazem isso aos montes. A areia parece asfalto, o "mar" não tem ondas e, bem... o resultado geralmente é algo parecido com isso:
Praia de 磐田市 (Iwata-shi, cidade de Iwata)
Praia de Kira-cho, em 吉良吉田 (Kira-Yoshida), na província de 愛知県 (Aichi-ken)
Não que seja feio de se ver, pelo contrário, é muito bonito assistir ao pôr-do-sol em um cenário desses, mas não é nenhuma Okinawa, com areia branca, fofa e mar de águas cristalinas. Muitos até brincam ao dizer que Okinawa não é Japão, por sua exuberante beleza, o que deixa os mais patriotas furiosamente ofendidos. Também pudera... tente comparar as fotos acima com as abaixo:
Os japoneses que me desculpem, mas Okinawa, sim, tem praias de verdade!
Como pode ver, o verão japonês poderia ser muito bem aproveitado em um paraíso desses. Mas como isso é privilégio de poucos, nós podemos aproveitar a estação mais quente do ano de outras formas. Afinal, o verão precisa ter algo de bom. Acredito que seja por isso que aconteçam tantos 祭り (matsuri = festivais) e comemorações nessa época, como o 花火 (hanabi) e o 七夕 (Tanabata). \( * ▽ * )/
O 花火大会 (hanabi taikai) é a festa dos fogos de artifício. Aqui é proibido soltá-los fora de época. Se o seu time de futebol ganhou, esqueça, não pode soltar rojões. Nem se o Júbilo (time de futebol aqui de Iwata) fizer gol, nem se o Japão ganhar a Copa do Mundo (bom, neste caso eu já não sei, já que o Japão nunca ganhou uma Copa... quem sabe este ano?). Shows pirotécnicos só podem ser feitos durante os meses de julho e agosto. E assim como tudo aqui no arquipélago, o hanabi não é uma simples queima de fogos. Como sempre, os japoneses buscam a perfeição em tudo o que fazem, e neste espetáculo, o objetivo é plenamente atingido. Há até fogos com formas de carinhas bem kawaii! Veja alguns vídeos do hanabi Japão afora!
E o melhor de tudo é que esse show é gratuito! O único problema é a multidão que disputa os melhores lugares para deslumbrar os belos fogos de artíficio...
Durante as festividades de verão, os japoneses se vestem com o 浴衣 (yukata), que é um kimono de verão, mais informal e leve. Sem deixar de lado, é claro, o 下駄 (geta = são aqueles chinelinhos de madeira super kawaii e, imagino, difíceis de se locomover) e o うちわ (uchiwa = leque). ^o^
O 七夕祭り (Tanabata Matsuri = Festival das Estrelas) a maioria deve conhecer, pois já faz parte do calendário de comemorações nipônicas de várias cidades brasileiras. No bairro mais oriental de São Paulo, a Liberdade, ou simplesmente Liba para os mais íntimos, as ruas são decoradas com bambus e enfeites de papéis coloridos. Aqui no Japão, o Tanabata sempre ocorre na sétima noite do sétimo mês do ano. Reza uma lenda super fofa que, na Via-Láctea, a princesa Orihime, que era muito boa em tecer, conheceu um rapaz chamado Kengyu, um pastor de gados, e eles se apaixonaram. Tipo, loucamente mesmo, só queriam ficar juntos, viviam em função um do outro e nada mais. A partir daí, eles ficaram preguiçosos e deixaram de fazer suas respectivas tarefas para ficarem grudados, e isso enfureceu o pai da menina, que os obrigou a se separarem. Só que a princesa ficou muito deprimida e, ao ver o sofrimento de sua querida filha, o rei resolveu então que o casal poderia se encontrar somente no sétimo dia do sétimo mês do ano, de acordo com o calendário lunar. Mas havia uma condição: eles deveriam atender a todos os pedidos vindos da Terra neste dia! A essência do festival é exatamente essa: escrever pedidos em papéis coloridos e amarrá-los em bambus.
Confesso: boto a maior fé na magia desse festival! Ano passado participamos de um Tanabata ainda no Brasil e escrevemos nossos pedidos nos papéis coloridos e os penduramos nos bambus. E, sim, alguns meses depois, nossos pedidos foram plenamente atendidos pelas estrelas! ありがとう、おりひめさんとけんぎゅさん!(Arigatou, Orihime-san to Kingyu-san = Obrigada, Orihime e Kengyu!) (^_^)v
Confesso: boto a maior fé na magia desse festival! Ano passado participamos de um Tanabata ainda no Brasil e escrevemos nossos pedidos nos papéis coloridos e os penduramos nos bambus. E, sim, alguns meses depois, nossos pedidos foram plenamente atendidos pelas estrelas! ありがとう、おりひめさんとけんぎゅさん!(Arigatou, Orihime-san to Kingyu-san = Obrigada, Orihime e Kengyu!) (^_^)v
E por que festival das ESTRELAS? Porque na mitologia japonesa os pombinhos são simbolizados pelas estrelas Vega e Altair, que se situam em lados opostos da galáxia. No entanto, curiosamente, essas estrelas se juntam uma vez por ano! とてもかわいいですね!(Totemo kawaii desu ne = muito fofo, não é?)
Enquanto nós, ocidentais, desacostumados com o clima de sauna do verão nipônico, ficamos quase sem roupa nas ruas do arquipélago, as japonesas se sufocam em mangas compridas e meia-calças, se escondem embaixo de sombrinhas e se lambuzam de protetor solar. Como já comentei uma vez, neste post, as mulheres japonesas são obcecadas por pele branca. Odeiam se bronzear, abominam manchas, detestam o sol. O que mais há nos supermercados são cosméticos para cuidados com a cútis. Essa obsessão é tanta que chega a ser engraçada já que, no calor, elas escondem o corpo todo e, no inverno, lá estão elas de minissaia! (⌒▽⌒)
Enquanto nós, ocidentais, desacostumados com o clima de sauna do verão nipônico, ficamos quase sem roupa nas ruas do arquipélago, as japonesas se sufocam em mangas compridas e meia-calças, se escondem embaixo de sombrinhas e se lambuzam de protetor solar. Como já comentei uma vez, neste post, as mulheres japonesas são obcecadas por pele branca. Odeiam se bronzear, abominam manchas, detestam o sol. O que mais há nos supermercados são cosméticos para cuidados com a cútis. Essa obsessão é tanta que chega a ser engraçada já que, no calor, elas escondem o corpo todo e, no inverno, lá estão elas de minissaia! (⌒▽⌒)
É comum o uso de armwarmers nessa época, o que é bem irônico, já que o propósito de um armwarmer, como o próprio nome diz, é esquentar os braços. Quem quer braços quentes no verão?! Mas elas usam o acessório para proteger a pele do forte sol do verão. Há vários modelos, cores e tamanhos, em qualquer supermercado ou farmácia têm. É bem estiloso e combina com o estilo das japonesas, no entanto, dá agonia usá-los debaixo de um sol de 30°C! Não basta passar bloqueador solar fator 40?! (*`へ´*)
O verão nos deixa sem apetite, então, o que comer nesta época? うなぎ!Sim, unagi é enguia, aquele peixe feio que parece uma cobra. É a especialidade culinária aqui da província de Shizuoka, onde moramos. No verão, a maioria dos restaurantes serve algum prato com o peixe, como a rede すき家 (Sukiya, que somos viciados!), que adicionou o gyudon de unagi ao cardápio esta temporada. Mas em outros restaurantes, há pratos para todos os paladares: desde sushi até sorvete de unagi! Haja coragem! Dizem que a enguia combate o 夏ばて (natsubate), que nada mais é do que aquele mal-estar que sentimos nas épocas mais quentes. Se é verdade ou não, não sei, pois ainda não criei coragem suficiente para experimentar este peixe tão exótico (e こわい (kowai = assustador...)! (´ε` )
Já que estamos falando de bichos, que tal falar de 虫 (mushi = insetos)? O que mais há no verão são insetos, e isso é igual no mundo inteiro. Só que no Japão, como dificilmente matam esses animais quando aparecem para atormentar - pois é, os japoneses veneram os animais, qualquer um, até os nojentos! -, acaba que aqui, no arquipélago, eles parecem existir em uma quantidade infinitamente maior. Mesmo com redinha em todas as janelas, os pernilongos invadem as casas e picam todos, além de ficarem fazendo aquele zumbido irritante em nossas orelhas quando estamos prestes a pegar no sono. Os siriris, aqueles cupins alados que ficam doidões ao encontrar algum foco luminoso, estão em toda parte, curtindo a maior rave nas luzes da cidade. As cigarras, que montam uma orquestra para compor a trilha sonora do verão japonês, são frequentemente ouvidas ao fundo de qualquer アニメ (anime = animação japonesa) e ドラマ (dorama = novelas japonesas) que se passe nessa estação do ano. E as aranhas... ('Д `*)
Ah... as クモ (kumo = aranhas)! Quem sofre de aracnofobia como eu, não poderia morar em lugar pior do que o Japão, a nação oficial das aranhas. O maior ecossistema de aracnídeos do planeta, aposto! Nunca vi tantas aranhas, de tantos tipos, formas, tamanhos, cores e espécies diferentes! Há pequenas e grandes, peludas e depiladas. Elas fazem teias nas escadas, nas janelas, nos carros (tanto dentro como fora!), nas roupas no varal, em você. Qualquer canto está bom para elas. Você anda na rua e um pedaço de teia sempre gruda em seu rosto (e você, ingênuo, sempre pensa ser um fio de cabelo...). Você acorda um dia, e não há nada em sua porta. Mas quando volta do trabalho, já há uma colônia de aranhas recém-chegadas em seu アパート (apato = apartamento) te saudando um inocente お帰り (okaeri = saudação dita por quem ficou em casa para quem retorna ao lar. Seria algo como bem-vindo de volta)! E não adianta destruí-las, outras aparecem e constroem tudo do zero! Elas não desistem! Pendurar roupas no varal é um risco mortal para quem tem medo de aranhas, pois, algum dia, alguma aranha grudará em alguma peça e você só irá reparar nela quando estiver andando em seu futon com aquelas pernas peludas e enormes. Deve ser algum tipo de lei ou regra do Japão, só pode! Todos aqui têm alguma história horripilante do tipo para contar. Eu ainda não passei por essa experiência pois sou precavida, evito pendurar roupas do lado de fora e estou sempre com a vassoura em mãos destruindo qualquer vestígio de teia que possa existir na varanda. (。ー﹏ー。)
Como eu adoro flores, não podia deixar de mencionar a planta símbolo do verão e, ironicamente, minha favorita: o ヒマワリ (himawari = girassol). Por ser uma planta que adora o sol e altas temperaturas, o girassol floresce durante todo o verão. Além de servir como ornamento de jardim, também dá sementes (que dizem ser deliciosas) e delas se extrai o óleo de girassol. Fácil de cuidar, resistente, belo, o ヒマワリ traz alegria a qualquer ambiente com suas pétalas em amarelo vibrante. É a mais feliz e positiva das flores, adoro-a! Sei que aqui no Japão existem centenas de campos de girassois, no entanto, ainda não tive o prazer de encontrar nenhum aqui perto. Se você conhece algum e puder indicá-lo, agradeceria muito. Afinal, a visita renderia um belo post com centenas de fotos maravilhosas! お願いします!(Onegaishimasu = por favor!)
Enfim, esse é o verão do Japão. Bem quente, cheio de bichos, mas com muitos festivais legais para compensar o calor. Uns gostam, outros odeiam. A não ser que você seja fã de fogos de artifício, venere o Tanabata Matsuri ou tenha fixação por aranhas e outros bichos nojentos, sinceramente, evite o Japão nos meses de junho, julho e agosto. Deixe para conhecer este país tão perfeito na primavera, quando há o florescimento da sakura, no outono, quando as folhas das árvores estão vermelhas, ou no inverno, quando neva, que será uma viagem melhor aproveitada. Fique longe do infernal verão japonês! ( * ▽ * ) v ☆
Ja, matta ne!